Nossa história
Trilhas de Longo Curso na Chapada: sonho antigo, sonho de muitos.
@julioitacaramby Exploratória Couros-Cordovil-São Jorge jul, 2011 (2)
@renatooliveiraalves1980 Travessia Rio da Prata – Engenho II (1)
@julioitacaramby Exploratória Sete Quedas abr, 2012 (3)
Os caminhos da Chapada dos Veadeiros não são novos. Dos povos tradicionais aos bandeirantes no século XVIII, da missão Cruls à coluna Prestes, várias pessoas e comitivas – famosas ou não – já abriram e percorreram caminhos nesse paraíso situado no coração do Brasil. A partir da década de 80, a região passou por profundas transformações, dentre as quais a chegada dos esportes de aventura e do ecoturismo que impulsionaram o planejamento e abertura de trilhas de longa distância na região muito antes do Caminho dos Veadeiros existir.
Em 1999 a operadora Travessia Ecoturismo criou o roteiro Travessia Leste, um das primeiras e mais conhecidas rotas de trekking na região. Interligando antigas trilhas usadas no garimpo e pecuária tradicional e lindas paisagens ao longo de 70 km entre os municípios de Alto Paraíso e São João d’ Aliança, foi premiado pelo programa do ministério do Turismo “ Talentos do Brasil Rural”. Além da concepção da rota, a operadora implementou e ajudou na estruturação dos pontos de apoio, construindo banheiros de camping e demais estruturas para a acomodação dos grupos.
Nos anos 2000 a região passa a ser intensamente investigada por alguns guias locais em busca de novas rotas e produtos turísticos. Destacam-se Marcello Nissen Clacino, Manoel Eugênio Pacheco (Pacheco), Cristiano Dantas (Verde), Alexandre (Heavy Metal), Luís Lima (Lula) e Balbi, que resgatando trilhas antigas e abrindo novas picadas – muitas vezes com difíceis negociações com proprietários rurais – marcaram época explorando e operando em locais isolados em Alto Paraíso e Cavalcante e abrindo trilhas como a clássica Travessia Segredo-Couros – atualmente fechada para visitação.
Entre 2002 e 2005 a ONG Berço das Águas, no âmbito da iniciativa Caminhos do Cerrado – Chapada dos Veadeiros, executou diversas atividades de mapeamento e planejamento para uma possível trilha intermunicipal com 190 km entre São João d´Aliança, Alto Paraíso e Cavalcante. Tiveram participação ativa nesse processo Patrick Maury, Carla Guaitanele, Ronaldo Sobral, Gustavo Machado, Karen Basso, Weverson Paulino, Thais Barreto, Caroline Joffilly e Maurício Leão.
Entre 2012 e 2017, Renato Oliveira, morador de Uruaçu, GO, e assíduo frequentador da Chapada dos Veadeiros, realizou cerca de 20 incursões para procurar o caminho mais bonito da Chapada dos Veadeiros, ligando o território Kalunga ao povoado do Muquém. Foram centenas de quilômetros percorridos em Cavalcante, Alto Paraíso, Colinas do Sul e Niquelândia. À época, essa ideia era chamada de “Transchapadeiros”.
Em 19 de junho de 2013, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros inaugura sua primeira trilha com pernoite: a Travessia das Sete Quedas. Com 23 km de extensão, esta que é a primeira travessia de muitos residentes do Planalto Central e um dos atrativos mais concorridos do Parque, levou um ano para ser concluída e contou com o apoio de uma equipe de consultores do ICMBio e de, pelo menos, 15 guias locais que se voluntariaram para ajudar na implementação. A Travessia das Sete Quedas é resultado de um processo de diálogo e planejamento de trilhas de longa distância na região, com ativa participação de guias e outros atores do setor turístico local, os quais sempre visualizaram o potencial da região em vistas às demais trilhas de longo curso estabelecidas no mundo.
Em setembro de 2016, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros promoveu a ‘Oficina de planejamento de trilhas de longo curso da Chapada dos Veadeiros’, evento que reuniu diversos representantes do setor turístico local e outros interessados para discutir uma proposta de trilha de longo curso na região. Nesse contexto, algumas expedições e atividades de mapeamento foram realizadas vislumbrando a “Transchapadeira”, que ligaria os principais atrativos da Chapada dos Veadeiros, incluindo o Parque Nacional.
Também em 2016 Orlandinho Barros, montanhista baiano à época residente em Brasília, consolidou e percorreu em três etapas, num total de 18 dias, uma rota de 320 km ligando o DF a São Jorge. Batizada de ‘Brasil Central’, esta rota erma, selvagem e cênica partia da região do Córrego do Urubu, seguindo pelas serras do Rio Maranhão, Córrego Rico, Serra do Meloso, Couros e Serra do Segredo, abrangendo o Distrito Federal, Planaltina de Goiás, São João d´Aliança e Alto Paraíso.
Bismarque Villa Real e João Lino por meio da Goiás Turismo, promoveram a implementação do Caminho de Cora Coralina, ligando a Cidade de Goiás a Corumbá de Goiás e misturando história, cultura e natureza ao longo de seus 300 km. Inaugurado em 2018 foi a primeira parte implementada do Caminho dos Goyazes, projeto de trilha desenvolvido pela Goiás Turismo, em cooperação com o ICMBio, que ligará Goiás Velho a Cavalcante.
Geraldo Bertelli, explorador, guia e um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento do turismo em São João d´Aliança e pelo resgate e reutilização de uma das rotas do Caminho do Muquém, concebeu uma nova travessia na região, a partir de suas explorações ao longo de mais de 20 anos. Com 128 km no sentido Sul-Norte acompanhando a Serra do Paranã e cortando todo o município de São João, foi batizada provisoriamente de “Caminho do Paranã” e foi a pedra fundamental de nossa história.
O início
@fernandotatagiba oficina no PNCV para o planejamento do C.V.
@BrunoDIas – Fórum do Caminho dos Veadeiros
Foi em novembro de 2017, com a concepção da Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso e Conectividade (posteriormente oficializada na Portaria Conjunta MMA/MTUR nº 407, de 19 de outubro de 2018), no âmbito do Programa Conecta (Portaria MMA nº 75, de 26 de março de 2018), que todas esses sonhos e projetos começaram a se aglutinar em uma única ideia. Inicialmente, a Rede previa quatro grandes corredores nacionais: Caminho do Peabiru, Corredor Litorâneo, Caminhos Coloniais e o já mencionado Caminho dos Goyazes.
No evento realizado em novembro de 2017 no Ministério do Meio Ambiente, com a presença de gestores públicos e sociedade civil, o sistema de trilhas foi apresentado e os participantes convidados a integrar a gestão e construção do Caminho dos Goyazes conforme os trechos de interesse, separados em cinco Grupos de Trabalho (GTs):
- Cidade de Goiás a Corumbá de Goiás (Caminho de Cora Coralina).
- Corumbá de Goiás ao Distrito Federal
- Distrito Federal-DF
- Distrito Federal à Chapada dos Veadeiros (São Jorge)
- Alto Paraíso (São Jorge) a Cavalcante
Após essa reunião algumas discussões foram realizadas por troca de e-mails entre os participantes que aderiram ao GT Distrito Federal à Chapada dos Veadeiros (São Jorge). Em 01 de março de 2018, Guilherme Alexsander Pereira – brasiliense analista de sistemas e criador do Trekking Brasília e do Trilhas Perdidas – criou o grupo de Whatsapp “Longo Curso – DF Chapada”, embrião do Caminho dos Veadeiros, e assume o papel de liderança do grupo, inicialmente composto por Márcio Barros (Associação de Escalada do Planalto Central – AEP), Helena Ditroya (Grupo de Caminhadas Brasília – GCB), Samuel Schwaida (Trekking Brasília) e Renato Oliveira, além do próprio Guilherme. Ao longo das conversas e trabalhos e com o passar dos meses, novos parceiros foram identificados e adicionados ao grupo, agregando seus conhecimentos e experiências, fortalecendo cada vez mais o projeto e ajudando a amadurecer o traçado: Thiago Beraldo (ICMBIO), Márcio Bittencourt (Rebas do Cerrado), Katiely Paiva (EcoBocaina), Geraldo Bertelli (Prefeitura de São João d´Aliança), Joana Sánchez (UFG), João Lino (Goiás Turismo), Luis Neves (ICMBIO), Marcello Nissen Classino (Grupo Bellatrix) e Fernando Tatagiba (ICMBIO).
Em junho de 2018, Samuel Schwaida – biólogo e montanhista paranaense residente em Brasília – assume a coordenação geral dos trabalhos e dá início à organização e estruturação de todo o corpo de voluntariado e da coordenação, bem como à compilação de uma primeira proposta de traçado a partir das discussões e do material reunido pelo GT. Esta proposta partia do consenso do GT de que a rota teria como linha mestra a Serra Geral do Paranã, por apresentar grande beleza cênica, maior estrutura para uma trilha democrática e possibilitar a consolidação de várias trilhas menores para uso em finais de semana e feriados. Tendo como eixo principal a rota concebida por Geraldo Bertelli ao longo da Serra do Paranã, se conectaria a São Jorge através da Travessia Leste e Travessia Cordovil-Couros (ou Segredo-Couros) para então se conectar à Travessia das Sete Quedas. Ao sul, se conectaria a Formosa por trilhas esquecidas ou ainda inexistentes mas que obrigatoriamente passariam pelo Parque Municipal do Itiquira, EcoBocaina e Pico de escalada do Belchior (Selva de Pedra).
Das ideias para o campo
Voluntários sinalizando o setor São João d´Aliança
Voluntários sinalizando o setor São João d´Aliança
A data de nascimento do Caminho dos Veadeiros pode ser estabelecida em 28 de setembro de 2018, quando foi realizado o “II Fórum Caminho dos Goyazes: Trecho DF-Chapada”. Na ocasião foram apresentados o conceito das trilhas de longo curso e a proposta da trilha ligando o DF à Chapada dos Veadeiros. A proposta foi então discutida e validada na presença de gestores públicos, praticantes de esportes de aventura, guias e outros representantes do setor turístico da região. No evento também foram estabelecidos os Grupos de Implementação (GI), responsáveis pela implementação da trilha em suas áreas de atuação:
- GI Formosa/Planaltina: coordenado por Katiely Paiva
- GI São João: coordenado por Samuel Schwaida
- GI Alto Paraíso: coordenado por Patrícia Andrade
Posteriormente, em novembro de 2018, o GT DF-Chapada definiu o nome ‘Caminho dos Veadeiros’ e adotou a pegada criada por Vitor Saraiva para o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. A partir de então, diversas atividades de exploração, mapeamento, sinalização, criação de grupos de trabalho temáticos e redes sociais foram realizadas, coordenadas principalmente por Samuel Schwaida, Márcio Barros, Geraldo Bertelli e Luiza Pizzutti, com o auxílio e apoio, inclusive financeiro, de diversos voluntários, membros da coordenação e da comunidade local. O envolvimento e apoio da Prefeitura Municipal de São João d´Aliança e da comunidade do local foram fundamentais para o sucesso dessas ações.
O ano de 2019 foi um ano bastante produtivo para o Caminho dos Veadeiros, no qual foram realizadas as primeiras ações de sinalização em São João d´Aliança, ao ponto de, ao final do ano, ser concluída e liberada a primeira rota de cicloturismo prevista, com 120 km, e parte da rota de trekking, com 68 km, incluindo a Travessia Duas Cruzes-Morro do Chapéu. Ainda em 2019 o Caminho dos Veadeiros também cresceu em divulgação, por meio de reuniões, apresentações e encontros de voluntários, tornando-se uma ideia e marca cada vez mais difundida e conhecida em toda a região.
Em 27 de novembro de 2019, foi realizado o “IV Fórum Caminho dos Goyazes”, novamente em São João d´Aliança, evento no qual foram realizadas a discussão e refino do traçado – que passou então a contemplar também a ligação até Cavalcante; a proposição de estratégias e ações para o ano subsequente; a escolha dos coordenadores e suplentes dos GT locais e a identificação de instituições para compor um futuro Acordo de Cooperação Técnica.
Em março de 2020 o Caminho dos Veadeiros foi adotado como estratégia de promoção do turismo sustentável no âmbito do projeto ‘Concretização do potencial de conservação da biodiversidade em áreas privadas no Brasil (GEF Áreas Privadas)’, financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), por meio do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (ONU Meio Ambiente), e executado pelo Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS), sob coordenação do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Por meio do projeto serão apoiadas ações para estabelecimento definitivo da governança, elaboração do planejamento estratégico e implementação da trilha na região da APA de Pouso Alto.
Crescendo e se organizando
Uma Trilha de Longo Curso é um organismo vivo em constante crescimento e adaptação, e para sua sobrevivência e desenvolvimento, é preciso se atentar às novas necessidades que o crescimento e idade trazem. Em 25 de abril de 2020 o GT DF-Chapada passa pela sua primeira reformulação para melhorar a comunicação interna e os processos de implementação. A partir desta data, o grupo “GT DF-Chapada”, criado no primeiro momento do projeto e tendo cumprido seu papel, passou a se chamar Coordenação C.V. e a incluir somente os representantes das instituições e colaboradores que desempenhavam um papel ativo no planejamento do projeto.
Em 04 de agosto de 2021, com vistas a formalizar a parceria e os esforços entre as instituições envolvidas na implementação do Caminho dos Veadeiros, foi firmado um Acordo de Cooperação entre Goiás Turismo, AEP (Associação de Escalada do Planalto Central – @aepescalada) e IIS (Instituto Internacional para Sustentabilidade), representando o projeto GEF-Áreas Privadas. Em 15 de setembro de 2021, a então Coordenação do projeto aprovou seu Regimento Interno Interino, o qual organiza e disciplina a estrutura e atividades do projeto. Em 17 de novembro de 2021 foi formado o Conselho de Coordenação (CONCCV), que além de garantir a representatividade dos diferentes grupos envolvidos no projeto, tem por responsabilidade a definição do traçado, o monitoramento das atividades de implementação e aprovar a prestação de contas .
Atualmente o Comitê Coordenador, junto com o CONCCV, orienta os trabalhos dos antigos Grupos de Implementação (GI), agora chamados de Coordenações Regionais (CR) – CR Formosa; CR Água Fria; CR São João; CR APA Pouso Alto; e CR Cavalcante – e dos Grupos de Trabalho Temáticos (GT): Comunicação & Design; Bike; Escalada; Pesquisa e Conservação.
Independente de nomes e organogramas, mutáveis e temporais, o Caminho dos Veadeiros continua sendo fruto do trabalho e paixão de diferentes pessoas que doam seu tempo, conhecimento e recursos, de acordo com suas possibilidades. Além de conectar paisagens e histórias, o Caminho dos Veadeiros conecta pessoas e diferentes saberes. Hoje são mais de 200 voluntários envolvidos e dedicados a abrir e manter o caminho, uma construção coletiva feita a muitas mãos que gera pertencimento e envolvimento com o Cerrado e com a Chapada dos Veadeiros.